Rolim de Moura,

Decisão de Fachin sobre dados da Lava Jato tem efeitos retroativos
A ofensiva de Aras para enquadrar a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba lança incertezas sobre o destino da operação que desbaratou um esquema bilionário de corrupção

Publicado 04/08/2020
A A

O relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Edson Fachin, derrubou nesta segunda-feira, 3, a decisão do presidente da Corte, Dias Toffoli, que havia determinado o compartilhamento de dados das forças-tarefa da Lava Jato com a cúpula da Procuradoria-Geral da República (PGR). A decisão possui efeitos retroativos, ou seja, a PGR não pode se debruçar sobre os dados já enviados.

No mês passado, durante o plantão do STF, Toffoli determinou às forças-tarefa da Lava Jato - em Curitiba, São Paulo e Rio de Janeiro - que enviassem à PGR "todas as bases de dados estruturados e não-estruturados utilizadas e obtidas em suas investigações". Com o retorno das atividades do tribunal, Fachin - relator da ação - analisou o caso e derrubou o entendimento de Toffoli, expondo as divisões internas do Supremo sobre os métodos de investigação da Lava Jato.

Após receber os dados, o procurador-geral da República, Augusto Aras, disse na semana passada que, se todo o MP tem 40 terabytes, só Curitiba possui 350 terabytes e 38 mil pessoas com dados depositados. "Ninguém sabe como foram escolhidos, quais os critérios, e não se pode imaginar que uma unidade institucional se faça com segredos", atacou o procurador-geral da República. Segundo interlocutores de Aras, os dados da força-tarefa não estavam armazenados em canais oficiais do MPF.

Ao derrubar o entendimento de Toffoli, Fachin alegou questões processuais, apontando que o instrumento utilizado - uma reclamação - não era a via adequada no caso. "Pelo exposto, nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, nego seguimento à reclamação e, com integral efeito ex tunc (retroativo), revogo a liminar", determinou Fachin.

A decisão de Toffoli, tomada em pleno recesso do STF, foi tomada em uma ação movida pela PGR, sob a relatoria do ministro Fachin, que questiona suposta ingerência dos procuradores ao investigar os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), quando ambos possuem prerrogativa de foro privilegiado.

"A direção única pertence ao procurador-geral, que hierarquicamente, detém competência administrativa para requisitar o intercâmbio institucional de informações, para bem e fielmente cumprir suas atribuições finalísticas", escreveu Toffoli na decisão.

Após a decisão de Fachin, Aras afirmou que a decisão do presidente do Supremo "reafirma a estrutura e a Organização do MP Federal, garantindo a união e as relações que devem nortear os órgãos inferiores em relação aos superiores".

Toffoli observou que o Ministério Público Federal "é instituição una, nacional e de essência indivisível, e como tal, conta com órgão central" que é o PGR. O ministro disse ainda que a Lava Jato, ao negar repassar informações ao PGR, cometeram "evidente transgressão".

Prazo

A ofensiva de Aras para enquadrar a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba lança incertezas sobre o destino da operação que desbaratou um esquema bilionário de corrupção, alterou a correlação de forças da política nacional e levou à cadeia importantes lideranças do País, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Até setembro, Aras vai decidir o futuro do grupo coordenado pelo procurador Deltan Dallagnol, mas já deixou claro que pretende impor uma "correção de rumos" com a adoção de um novo modelo de investigação, sem métodos "personalistas" nem "caixas-pretas".

"A hora é a hora de corrigir os rumos para que o lavajatismo não perdure, mas a correção de rumos não significa redução do empenho no combate à corrupção", disse Aras, em uma live com um grupo de advogados na última terça-feira. "O lavajatismo há de passar."

Em 10 de setembro, vence o prazo para a renovação da força-tarefa da Lava Jato no Paraná, grupo composto por 14 procuradores da República sob a coordenação de Deltan. Na prática, a renovação significaria manter toda a estrutura hoje disponível, não apenas de procuradores, mas também servidores de apoio, que atuam em áreas de assessoria jurídica, análise, pesquisa e informática. No Rio, o prazo é 8 de dezembro.

Já a força-tarefa em São Paulo não tem designações em bloco, ou seja, possui prazos distintos para cada um dos seus membros, mas o grupo alertou ao Estadão/Broadcast Polítco que o número de integrantes que atuam com dedicação exclusiva à Lava Jato pode cair pela metade a partir de setembro.

Gostou do conteúdo que você acessou?

Quer saber mais? Faça parte dos nossos grupos de notícias!

Para fazer parte, acesse um dos links adiante para entrar no grupo do WhatsApp ou acessar nosso canal no Telegram